sexta-feira, 10 de agosto de 2007

Venezuela tem o gás que Chávez promete?

Na segunda escala da viagem que faz pela América do Sul, o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, prometeu ontem fornecer gás e petróleo pelos próximos 100 anos ao Uruguai. Dois dias antes, Chávez já havia oferecido o gás venezuelano à Argentina, prometendo investir na construção de uma unidade de regaseificação em solo argentino. Analistas questionam, porém, a viabilidade imediata de projetos de gás venezuelano. A reportagem é de Marcos de Moura e Souza e publicada pelo jornal Valor, 9-08-2007.
A disposição de Chávez de abastecer a região esbarra em alguns obstáculos, dizem analistas. O primeiro deles é a desconfiança de especialistas em relação à real dimensão das reservas venezuelanas. O segundo, a necessidade de investimentos intensivos e de tecnologia de ponta para a construção de uma unidade de liquefação de gás em solo venezuelano. A construção de um equipamento como esse levaria de quatro a cinco anos e custaria até US$ 3 bilhões, segundo analistas. Uma unidade de regaseificação (ou regás) - como a prometida por Chávez à Argentina - custa US$ 500 milhões e poderia ficar pronta em três anos.
O empreendimento não é, portanto, uma alternativa para as necessidades urgentes da Argentina de mais energia, avalia Marco Aurélio Tavares, consultor da Gas Energy Consultoria Empresarial.
A Venezuela tem a maior reserva de gás natural da América Latina, mas a sua quantificação ainda é motivo de debate. "Os números das reservas de gás da Venezuela não são confiáveis. Até mesmo no que diz respeito ao petróleo, os números da produção são questionados", diz outro especialista, Rafael Schechtman, diretor do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura.
A estatal de petróleo venezuelana PDVSA diz que o país tem capacidade comprovada de gás de 151 bilhões de pés cúbicos (4,2 bilhões de metros cúbicos). Hoje, porém, a Venezuela produz pouco e precisa até importar gás da Colômbia.
Schechtman vê ainda outro potencial obstáculo à construção na Venezuela de uma unidade de liquefação (que transforma o gás em gás natural liquefeito, ou GNL) - projeto que, segundo a PDVSA, está contemplado no orçamento de US$ 16 bilhões para o período de 2005 a 2012. "Uma planta de liquefação precisa ter escala, precisa ter vários clientes, para se tornar economicamente viável. E eu acho difícil que outros países assinem contratos de longo prazo para compra de GNL da Venezuela devido às oscilações políticas", diz.
Em 2005, uma dessas unidades de liquefação foi entregue em Trinidad e Tobago, ao preço de US$ 1,2 bilhão, valor dividido entre multinacionais e o governo do país. O Peru também está construindo a sua. Já Brasil e Chile constroem usinas de regaseificação (que transformam GNL em gás). É difícil acelerar projetos desse tipo, pois há uma forte demanda pelo mundo por essas instalações.
O GNL é opção ao gás natural quando este não pode ser transportado por dutos. O próprio Chávez disse dias atrás que "esfriou" a idéia de construir o megagasoduto na América do Sul. A oferta de enviar GNL à Argentina indica que o gasoduto está fora dos planos.
Ontem, no Uruguai, Chávez anunciou que ele e o presidente Tabaré Vázquez assinaram um acordo que provê "segurança energética" ao Uruguai por 100 anos, com base no petróleo e gás venezuelanos. Ele disse que priorizará o fornecimento aos países latino-americanos, para ampliar a integração regional, e que assinará acordo semelhante, em suas outras escalas, no Equador e na Bolívia.
Anteontem, reforçando seu discurso de que a Venezuela quer ser a fonte energética da região, Chávez disse que "América Latina precisa da Venezuela como a Europa precisa da Rússia na área de energia".

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